“UMA IGREJA SOLIDÁRIA COM A CAUSA DAS COMUNIDADES AMERICANAS”

INTERVENÇÃO DO BISPO URIAH ASHLEY - PANAMÁ

 

Para adentrarmos fresta tema é necessário definir a palavra “SOLIDARIEDADE”, cuja definição está ligada necessariamente ao Evangelho.

O apóstolo São Tiago escrevia: “Meus irmãos, de que serve alguém dizer que tem fé e não tem obras? Pode a fé salvar, neste caso? Se um irmão ou uma irmã não têm com que se vestir e o que comer todos os dias, e um de vós lhes disser: “Ide em paz, aquecei-vos, bom apetite!”, sem, porém, lhes dar o necessário para subsistir, de que adiantaria? Do mesmo modo, a fé que não tivesse obras estaria morta no seu isolamento. (Tg 2,14-17)

A Igreja desde suas origens tem sido solidária com a pessoa. Jesus cristo é a manifestação real da solidariedade com o ser humano, pôr isso para sermos solidários devemos Ter a mesma disposição de Cristo: “Comportai-vos entre vós assim, como faz em Jesus Cristo” ela que é de condição divina, não considerou como presa a agarrar o ser igual a Deus. Mas despojou-se, tomando a condição de servo, tornando-se semelhante aos homens, e pôr seu aspecto, reconhecido como homem; ele se rebaixou tornando-se obediente até a morte, e morte numa cruz. Foi pôr isso que deus o exaltou soberanamente e lhe conferiu o Nome que está acima de todo nome, a fim de que ao nome de Jesus todo joelho se dobre, nos céus, na terra e debaixo da terra, e todo língua confesse que Jesus cristo é o Senhor para a glória de deus Pai. (Filp 2,5-11).

O Seguimento de Cristo significa comprometer-se a viver seguindo seu estilo. Esta preocupação de coerência entre fé e vida está presente nas comunidades cristãs. “Em verdade eu vos declaro, cada vez que não o fizestes a um destes mais pequenos, a mim também não o fizestes. (MT. 25,45). A consciência da comunicação com Jesus Cristo e com os irmãos, que é por sua vez, furto da conversão, leva a servir ao próximo em todas as suas necessidades, tanto materiais quanto espirituais, para que em cada pessoa resplandeça o rastro de Cristo> Por isso a solidariedade é fruto da comunhão que se fundamenta no mistério de deus Uno e Trino, e no Filho de deus encarnado e morto por todos. Expressasse no amor do Cristão que busca o bem dos outros, especialmente dos mais necessitados”. (Igreja na América 195)

Em tempos mais recentes, após o período pós-conciliar, a Igreja fez um esforço pela inserção profética na transformação social, política e cultural do continente americano voltando-se solidariamente na defesa dos direito dos mais necessitados, dos mais pobres.

Este esforço realizado, através da doutrina social da Igreja, é parte da “missão evangelizadora”(RS 41) e tem o “valor de um instrumento de evangelização”(CA, 54) porque ilumina a convivência concreta da nossa fé.

A Igreja, em seu ministério profético, tem o serviço de que os teólogos prestem ao povo de Deus, que deve estar enraizado na Palavra, em aberto diálogo com os pastores e em plena fidelidade com o Magistério. Nesta perspectiva, este trabalho contribui para a inculturação da fé e a evangelização das culturas, assim como para impulsioná-lo a favor da justiça social, dos direitos humanos e da solidariedade com os pobres.

O princípio da solidariedade se baseia em que somos irmãos, pela filiação divina e da natureza humana, com a responsabilidade fraterna “levar os fardos uns dos outros”(Gal 6,21) em plano pessoal, social, nacional e internacional. Neste sentido a Igreja reconhece que “entre a evangelização e a promoção humana existem efetivamente laços” muito fortes, vínculos de ordem antropológica, porque a pessoa a ser sujeito com os seus problemas sociais e econômicos. Laços de ordem teológica já não se pode dissociar o plano da criação do plano da redenção que chega até as situações concretas de injustiças a que se há de combater e de justiça a que se há de restaurar. Vínculos de ordem eminentemente evangélico, como é o da caridade. (EM 31).

As características do momento atual de nossos povos na ordem social, desde o ponto de vista objetivo, se visualiza em uma situação de subdesenvolvimento detectado por fenômenos massivos de marginalidade, alienação e pobreza, e condicionada em última instância, por estruturas de dependência econômica, política e cultural com respeito as metrópoles industrializadas que detém do monopólio da tecnologia e da ciência(neocolonialismo). Um ponto de vista subjetivo, a tomada de consciência que esta mesma situação, provoca em amplos setores da população latino americana, atitudes de protesto e aspirações de libertação, desenvolvimento e de justiça social. (Medellin, conclusões 10,7)

Os bispos Latino-americanos reunidos em Santo Domingo fizeram seu este clamor dos marginalizados, assumindo com renovado ardor a opção evangélica preferencial pelos pobres em continuidade com Medellín e Puebla. Esta opção não exclusiva, nem excludente iluminará, à imitação de cristo, toda nossa ação evangelizadora.

Com esta visão convidam-nos a que se promova uma nova ordem econômica, social e política conforme a dignidade de todas e de cada uma das pessoas promovendo a justiça e abrindo todas elas horizontes de eternidade.

Preferentemente, este princípio protege os seres humanos, que não foram acostumados a viver isolados, mas sim amistosamente unidos pela caridade dentro de uma comunidade humana. Protege os mais fracos e pobres porque “quanto mais indefesos estão na sociedade, tanto mais necessitam de apoio e cuidados dos demais, e em particular, a intervenção da autoridade pública.” (Centesimus ennus, 10).

A Igreja na América deve encarnar nas suas iniciativas pastorais a solidariedade da Igreja Universal para os pobres e marginalizados. Sua atitude deve incluir a assistência, promoção, libertação e aceitação fraterna. A Igreja pretende que não haja em absoluto marginalizados. A lembrança dos capítulos obscuros da história da América relativos a existência da escravatura e de outras situações de discriminação social, há de promover um sincero desejo de conversão que leve a reconciliação e a comunhão. (Igreja na América, 58).

Atenta ao clamor dos mais necessitados, escutando sua voz “a Igreja deve viver com os pobres e participar de suas dores. “Deve finalmente testemunhar por seu estilo de vida que suas prioridades, suas palavras e suas ações, e ela mesma estar em comunhão e solidariedade com eles”.

Assinala o Papa que em sua Exortação Pós Conciliar que “Se a Igreja na América, fiel ao Evangelho de Cristo, um especial atenção aquelas etnias que são objetos de discriminações injustas, como são os indígenas e os afroamericanos. (Igreja na América, 64).

Ao tratar da situação dos afroamericanos o Santo Padre indicou que os americanos de origem africana segue sofrendo também, em algumas partes, preconceitos étnicos que são um obstáculo importante para seu encontro com cristo. Já que todas as pessoas, de qualquer raça e condição, foram criadas por Deus a sua imagem, convém promover programas concretos em que não devem faltar a oração em comum, os quais favoreçam a compreensão e a reconciliação entre povos diversos, sendo pontes de amor cristãos, de paz, de justiça entre todas as pessoas. (Igreja em América, 234).

Para conseguir estes objetivos é indispensável formar agente pastorais competentes, capazes de usar métodos já “inculturadas” apropriadamente na catequese e na liturgia. Assim também, se conseguirá melhor um número adequado de pastores que desenvolvam suas atividades entre os indígenas, se promovam as vocações ao sacerdócio e a vida consagrada no meio do povo. (Igreja em América, 235).

Manifestações de solidariedade da Igreja:

A Igreja tem dado passos concretos no campo da solidariedade com o povo Afroamericano.

Os bispos Latino-americanos junto ao Santo Padre pedirão aos povos Indígenas e Afroamericano, por tudo aquilo que tem marcado o pecado, a injustiça e a violência. Quarta-feira, 21 de outubro de 1992. E ainda, comprometeram-se em santo Domingo, conscientes do problema de marginalização e do racismo que pesa sobre a população negra, em sua missão evangelizadora, a participar de seus sofrimentos e acompanhá-los em suas legítimas aspirações em busca de uma vida mais justa e digna para todos.

Igualmente, reconheceram os valores e contribuições dos Afroamericanos, e manifestam seu desejo de apoiá-los na defesa de sua identidade e no reconhecimento de seus próprios valores; como também ajudá-los a manter vivo seus usos e costumes compatíveis com a doutrina cristã.

Do mesmo modo os bispos comprometeram-se a dedicar especial atenção as causas Afroamericans no campo pastoral, favorecendo as expressões próprias de sua cultura.

Concretamente os bispos assumiram o compromisso na promoção das etnias, para a promoção humana através de:

Superar a mentalidade e a prática de um desenvolvimento externo, para um e desenvolvimento em que as comunidades sejam sujeitas dos seus destinos;

Contribuir efetivamente a fim de erradicar as políticas que desejam que as culturas autóctones desapareçam, como meio de forçar uma integração ou políticas que busquem manter as pessoas isoladas e marginalizadas da realidade nacional;

Impulsionar a plena vigência dos direitos humanos dos Indígenas e Afroamericanos, incluindo a legítima defesa de suas terras;

Como gesto concreto de solidariedade em favor dos Camponeses, Indígenas e Afroamericanos, apoiar a Fundação “Populorum Progessio”, instituída pelo Santo Padre;

Fazer um revisão dos nossos sistemas educacionais para eliminar definitivamente todo aspecto discriminatório com relação aos métodos educativos, quantidade e aplicação dos recursos;

Fazer possível, para garantir aos Indígenas e Afroamericanos, uma educação adequada às suas respectivas culturas, começando com a educação bilingüe.

Na Igreja Latino-americana e Caribenha tem surgido leigos, religiosas e sacerdotes que, a partir de sua consciência cristã e eclesial se organizam a fim de buscarem respostas às situações de pobreza, em que vivem as comunidades Afroamericanas, do racismo, da discriminação, dos prejuízos e da marginalizarão cultural.

Assim como surgiram os Encontros de Pastoral Afroamericanos, que são espaços para recuperar a cultura negra, os elementos novos e antigos, para oferecer à Deus, em forma de louvor, de clamor, de dança, de gestos e símbolos toda a sua dor, alegria e sobretudo o seu empenho de crer na vida (Antônio Aparecido da Silva: Evangelização Libertadora a partir dos negros).

Temos sinais concretos de solidariedade da Igreja com o povo Afroamericnano, que da maneira concreta fez uma opção pelos Afroamericanos:

Tem impulsionado a evangelização inculturada, respeitando as raízes culturais dos negros, utilizando símbolos, filosofia, cosmovisão e valores próprios desta cultura. Faltam mais Bispos, sacerdotes, religiosas e leigos que assumam ou encarnem, na sua missão evangelizadora, esta opção da Igreja Universal e Latino-americana.

O acompanhamento constante e positivo do Conselho Episcopal Latino-americonao, através do Departamento de Missão. Com pessoal e apoio econômico na organização e execução dos Encontros de Pastoral Afroamericana.

A criação do Secretariado de pastoral Afoamericana (SEPAFRO).

O impulso e reconhecimento dos esforços realizados pelos agentes de pastoral na implementação de pastoral inculturada.

Com isso, trata-se de não ter o povo negro, como objeto de estudos e nem como destinatários passivos da ação da Igreja. Busca, portanto, uma maior participação nos processos vitais dos negros, no processo de recuperar sua história e forjar seu futuro. Enfim, de levar pela ação evangelizadora, a criação de uma Igreja Afroamericana com expressões, ministros, liturgias próprias, onde o negro é plenamente sujeito da evangelização (Dennis King, Pastoral Afroamericana).

Queremos concluir, exortando aos nossos povos Latino-americanos, a que recuperemos o espírito de solidariedade que caracterizava nossas comunidades negras. Devemos lutar para que este Dom de Deus, de sentir-se membro solidário da comunidade, se cultive em nossas crianças e jovens. Que recuperemos a memória e a prática da solidariedade familiar e comunitária, onde a nossa mulher negra é especialista, nesta arte.

Esta é, afinal de contas, a alternativa efetiva que as Comunidades Afroamericanas tem para enfrentar a sociedade neoliberal com suas manifestações.

Tomado de Pastoral Afro-brasileira

Pastoral Afro Cali (XII EPA Colombia - Documentos)